Abraçando-se, sorria e
balançava-se feliz. Os olhos, brilhantes jabuticabas, passeavam entre os meus e
o grande embrulho colorido ao pé da árvore. Esperava meu sinal. – Vá. Pode
pegar os presentes. – Lentamente se abaixou. Com um cuidado imenso, pegou o
embrulho e levou-o a um canto da sala. Paramos todos para olhá-lo. Ele era todo
um imenso sorriso. Entre suas perninhas surgiu um
grande caminhão de bombeiros. Bateu palmas. Depois as pequenas mãos começaram
as descobertas. Luzes se acenderam, sirene gritou e o caminhão saiu de dentro
do seu pacote. Sorridente, abriu todos os outros presentes. Chamei-o para cear.
Não quis. Sua fome, olhos, boca e sentidos estavam naqueles brinquedos
coloridos que nunca tivera. Dormiu cercado por eles. No dia seguinte, minha
filha o levou. Seu olhar era uma mistura de encantamento e despedida. O meu,
ardência e calmaria. Era natal.
Paulo Bentancur A beleza inicial
narrada no episódio XXV de COISAS DE LOU (irresistível série de uma espécie
de minicontos de tom autobiográfico e atmosfera ficcional) se soma a uma
delicada emoção inevitável quando o protagonista é uma criança e a natureza
mágica de seus desejos (brincar) sendo atendida.
Ainda mais num evento emblemático como o Natal. Mas quem escreve com essa
síntese (a adensar mais ainda o impacto psicológico, o encantamento e a
subsequente contundência) é Lourença Lou, com sua prosa de quem também, na
poesia, vai longe e sempre impecável no ritmo e sem nunca abrir mão da
brevidade. Prosa certeira e eufônica, entre a força de um lirismo que sacode o
leitor. A contundência principal é o desfecho. Brinquedos na mão, o menino é
levado embora no dia seguinte. Mistura êxtase e essa sutil amargura da despedida.
Quanto à testemunha da narradora, que certamente o trouxe de alguma instituição
para passar aquela noite, "ardência" (prenúncia do pranto) e
"calmaria" - porque, humaníssima, deu-se também um belíssimo
presente, realizando o mais pleno imaginário de um menino que de outra forma
passaria uma noite precária, sem sonho algum, e, menos ainda, sem nenhuma
realidade tomada de exuberância. Tocante demais, Lou. Tua série, para meu gosto, já é um êxito.
Beijos, carinho, admiração.