Nossos olhos estavam pregados na televisão. A cada novo boletim, mais
expectativas. Tancredo, o presidente escolhido sem voto popular, estava no
Hospital do Coração, em São Paulo, gravemente doente. Minha sogra rezava
continuamente. Meu sogro dizia: já está morto e não querem falar. Não queria a
morte dele. Nunca quis. Mas não foi para ter um presidente com aval dos
ditadores que eu carregava tantas marcas. Agora eu já não sabia o que seria
pior. O fantasma dos anos de chumbo perseguia a todos nós. Um aperto no peito
me impedia de falar. Medo. Meu filho caçula choramingou. Fui amamentá-lo
tentando não pensar em meu marido lá na Amazônia, correndo o risco de ser
picado por um veneno fatal ou um acidente na obra. Morreria. Lá não havia Hospital
do Coração. Às vezes ele me irritava tremendamente com essa quase alienação. De
repente, meu sogro gritou: Eu não disse? Eu não disse? Fechei a porta do quarto. Naquele momento eu queria acreditar em Deus. Precisava acreditar que havia uma
justiça acima daquela junta militar, que durante mais de 20 anos pairara como
nuvem negra sobre nossas cabeças. Apertei com força meu filho ao peito. Medo e
solidão. Não queria a morte de Tancredo. Queria a certeza de um marido vivo e parceiro
das minhas angústias.
Lourença Lou