sexta-feira, 28 de setembro de 2018

XXVIII


Eu a vi assim que entrei. Olhar perdido no fundo do salão como se nada mais existisse além da incredulidade que a paralisava. Perder mãe é um desvio de rota quase fatal. É injusto que num coração pequeno tenha que caber tanta falta. A dor dela doía em mim, mas eu sabia que ela seguiria seu caminho. Porque viver, viver seria imperiosamente necessário. E aprenderia, como eu, que amor não é dado de graça. Só amor de mãe.

Lourença Lou


Paulo Bentancur COISAS DE LOU é uma série muito séria, no sentido de um projeto profundo, de enorme consistência, tomado de vida, e vida intensíssima. Mesmo quando, neste episódio, haja a imperdoável entrada em cena da não convidada morte. Ainda mais na situação com que a narradora se depara: uma meninina que acaba de perder a mãe! A ótima leitora Gratia Cynthia, em seu elogio ao estilo de Lourença Lou, parece estar se referindo a este trecho, por exemplo: "Perder mãe é um desvio de rota quase fatal. É injusto que num coração pequeno tenha que caber tanta falta." Fosse eu continuar a citar outros trechos tão eufônicos, repetia o texto inteiro. E são apenas seis linhas! Fica para sempre, como uma sentença brutal, a constatação de que durante a vida espera essa criança o duríssimo aprendizado: "amor não é dado de graça. Só amor de mãe." Emoção inestancável na maior síntese. Beijos, querida amiga, parceira Lou, carinho, admiração.


L

Não gostava de garotos. Andava sobre saltos e achava que homens maduros eram os grandes parceiros. Aquele menino subverteu meus conceitos ...